sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

“O gAnDa MaLuCo!”

 

Todos já foram vítimas do mesmo. Muitos dos vossos amigos, conhecidos e coisos, durante um dado período da vossa vida, ou em dado momento, normalmente de alargada imprudência, regada com abundante álcool, mimaram-vos, com a célebre frase: “Arnaldo, pá, és um ganda maluco”.

Em todos vós, eu sei pelo que passei, esse reconhecimento público da qualidade de “ganda maluco” levou a que o vosso comportamento desde então, fosse o mais desajustado possível, pois a ânsia de voltar a ouvir a mesma frase era enorme. De facto voltar a ouvir a expressão “és um ganda maluco” torna-se uma verdadeira droga, e os sujeitos acariciados uma vez com tal mimo tornam-se repentinamente verdadeiros agarrados. Primeiro contentam-se em ouvir, a referida representação, uma vez por mês, mais tarde, em alguns casos, em que a patologia já se torna demasiado grave e irreversível, querem ouvir o delicioso impropério, pelo menos, de cinco em cinco minutos, quando não continuamente.

Para tal, preconizam as brincadeiras mais estúpidas que a um ser humano é possível efectuar, deixam de pagar bilhetes nos transportes, mas só ao pé dos amigos que lhes podem efectuar o elogio, mesmo que sejam possuidores do passe social, atiram-no pela janela, o pensamento é: - Que se lixe a multa, quero é voltar a ouvir que sou um ganda maluco; baldam-se às aulas para ir fumar um cigarro, claro que roubado do maço que o descuidado “setôr” de matemática que o esqueceu em cima da secretária. Descem as escadinhas de São Vicente de skate, trotineta, ou de patins, de preferência de uma só vez; e para arrematar, a festiva bronquice, chumba-se o ano lectivo com as piores classificações possíveis. Mais tarde, já num estado mais adulto, sim porque o conceito de “ganda maluco também amadurece”, despejam-se copos de vinho tinto nos vestidos imaculados de noivas nervosas, depois de se fazerem as maiores asneiras na despedida de solteiro do melhor amigo, tudo isto só para o desesperado do agarrado ouvir uma vez mais: “´és um ganda maluco”.

Com a adição de anos vindouros, nos almoços e jantares de amigos, porque já ninguém voluntariamente o faz, o desesperado repete em cada memória que despeja para cima da mesa “eu era um ganda maluco”. Despejo esse anuído pelos amigos mais chegados, até ao momento em que já ninguém podendo ouvir tal diz em voz alta: “- estás maluco ou quê? Já ninguém te pode ouvir a dizer essas mxxxxs. Fxxx-se pá! Vê é se cresces, continuas a ser o mesmo cxxxxxo que eras quando tinhas doze anos. ” (peço desculpa pelo vernáculo mas os gandas malucos só assim entendem que o conjuntura não lhes é de fortuna.

É nesse preciso momento que o “ganda maluco” desperta para uma nova vida! Ele que até então simplesmente interpretou, na perfeição, o papel que os amigos/grupo lhe deram para interpretar, estes, num só ímpeto, sem anunciar previamente, proibem-no de recordar aquelas que eram as únicas memórias estupendas que o “ganda maluco” tinha e, que até então, o faziam sentir especial.

Para os que não se suicidam de imediato ou vão vender gelados para Cabo Verde, esse é o momento em que se destapa o outro “fulano” que até então estava escondido no “ganda maluco” mas que ainda não tinha ousado dar a face. Agora é momento do tal de: “agora estou muita certinho”. O “agora estou muita certinho” é o tipo que em tudo o que diz e que faz, fez ou irá fazer no promissório futuro certinho, acaba sempre as frases em: “agora estou muita certinho.” Por exemplo, quando fala da namorada diz: Ando às dois meses com a Anabela, como vês “agora ando muita certinho”. Quando compra os bilhetes para ir ao cinema, diz olha vamos ao cinema à noite ver o último do Silvester Stalone, como vês agora “ando muita certinho”. Nos casos mais bicudos, antes de referir o que quer que faça, fez ou fará, diz “agora ando muita certinho”, um exemplo flagrante é: “eu agora como ando muita certinho” vou às compras compra um litro de azeite, e como estou muita certinho antes de vir às compras, porque agora estou muita certinho, fui ver a acidez do azeite, porque agora estou muita certinho e não me quero enganar. Como estou muita certinho sei te dizer que acidez do mesmo que é de 0,5%.

Ora, também ninguém pachorra para tolerar este tipo se arquétipo durante muito tempo. Pelo que, em dado dia, em dada situação, alguém vai dizer: “ O que se passa contigo pá, eras um ganda maluco e agora andas todo certinho”. Já ando preocupado contigo!

Claro está que é precisamente nesse ápice que o desgraçado fica para sempre na merda! Normalmente casa-se e espera, ansiosamente, pela reforma!

The Young Gods - La Fille De La Mort


Serge Gainsbourg - L'anamour


Air - Le Soleil Est Pres De Moi


Ali Farka Toure - Savane


Les Negresses Vertes - Face à La Mer


domingo, 2 de fevereiro de 2014

Grauzone - Eisbär


A arquitectura da alma

 

De vez em quando protestava em silêncio, hoje não consigo mais esconder de mim próprio a falta de benevolência que a minha alma tem para comigo. As almas são como que efectivas esponjas do certo e do errado que ladeia a nossa vida. Absorvem coisas más, péssimas terríveis, que de modo seguro a infectam, precisando para manter a sua correcta e sã textura de elevadas vivências, já agora, santas e puras. O que não quer dizer que o input tenha que ser igual ao output. Não, de todo! Longe disso! A alma para se manter animada precisa de um ínfima parte de bem relativamente a um todo de mau. Nunca efectuei um estudo aturado quanto a esta matéria, mas diria que alma precisa de uma parte de vinte para que a sua elasticidade e vigor se mantenham. Claro que, ainda que a alma tenha uma correcta proporção dos elementos enunciados, ainda assim precisa de ser exercitada. Ao exercitar-se a alma, hoje, através dos correctos exercícios, espirituais e carnais, sim porque a proteína carnal também alimenta a alma, consegue-se, em alguns casos alcançar uma maior vida eterna. Uma maior vida eterna, dizem vós? Sim uma maior vida eterna! Não foi um lapso é uma realidade absoluta.
 
“Dejalo si quieres continuar (hermano)
Sal ilumina tu vida
Todo el cielo aplatandote
Dime que hars (intentalo)
Ilumina ese amor
Antes que se vaya
Algo siempre te entristese
Cuando todo va bien
Que pasa contigo?
Algo siemre te entristese
Cuando todo va bien
Que pasa contigo?
Que pasa contigo?
Dejalo si quieres continuar
No ocultes tu alma al sol
Tienes una vida preciosa
De que sirve si solo
Mueres suavemente”


Desculpem a perturbação, desde há uns dias a minha alma sintoniza-se com a América Latina, escutando as súplicas, preces e orações de almas tresmalhadas em galhofeira agonia. Ligo-me, involuntariamente a elas, e só quando a carga edílica cessa, é que consigo retornar aos meus pensamentos pessoais. Sinal evidente de que o meu input negativo já ultrapassou o ponto anterior ao ponto de não retorno! Não enunciei anteriormente que a alma quando está em absoluta carga negativa, alterando a sua forma óptima, tem tendência para se tornar viciada em cargas negativas, acabando, a final, por se tornar num áspero e desgastado espírito. Todas as almas têm naturalmente essa propensão, razão pela qual, eu tenha referido que uma alma optimizada tenha uma maior vida eterna. A manutenção da alma em vida eterna advém sem dúvida alguma do estado em que a sua santidade é inatacável. Muitas almas, acredito que a maior parte até, conquistam a vida eterna no Paraíso, mas a sua resistência à eternidade depende, em muito, da sua manutenência em santidade. Se na terra o input do bem é efémero, no Céu este é total. Se alma não mantiver todas as suas as carótidas em estado impecável, e viçosa elasticidade (que advém de um correcto e doseado exercício, como se viu) torna-se preguiçosa. Ora, como não poderia deixar de ser, uma alma preguiçosa deixa de ser santa, pelo que não poderá viver em santidade e terá que, necessariamente, abandonar a santa vida eterna. Sendo transferidas para o Purgatório vivendo sob condição e sujeitando-se a ora a um processo de purificação ou a um castigo temporário (depende proveniência da alma e do estado em que esta se encontra) para serem então amanhadas, as necessárias vezes, até que estejam prontas a reconquistar o reino dos céus (a vida eterna, necessariamente no Paraíso). As que não que não conseguem suportar, em alguns casos, o exasperante tempo necessário à sua elevação ao Paraíso, são levadas ao Inferno para que este, através de eivados e complexos processos de incineração, as reacondicione ao seu estado mais ínfimo de modo a que renasçam, por incorporação, num qualquer nascituro. Quando popularmente se diz que “aquela criança parece que tem o diabo no corpo”, nada é mais acertado, pois a alma fazia pouco tempo atrás ainda estava no referido processo de reciclagem.
“Que pasa?
Que pasa contigo?
Que pasa contigo?
(Mi hermano)
Que pasa contigo?
Escucha a tu propia voz
Salva tu amor
Que pasa contigo?
Antes que se vaya
Si todo va bien
Que pasa contigo?
Que pasa contigo?
Mirate a ti mismo
Enfrentalo
Que pasa contigo?
Mi hermano
Ven animate
Que pasa contigo?”
As perturbações e as involuntárias sintonias américo latinas continuam e agravam-se, antes estas, em que sempre entendo algo, que as anteriores, que penso, provenientes do leste da Europa, em que alcançava a sua dor, mas não necessariamente o seu conteúdo. Desculpem-me todo este desabafo, e a introspectiva enxurrada de concepções acerca da alma, mas sinto-me agastado, e sem lugar na minha alma, para guardar tantos pecados e dúvidas que me fazem, quase que obrigatoriamente, conhecer. Hoje, ao contrário de outros tempos, sinto que os paroquianos já não vêm à igreja confessar-se para serem ajudados na sua purificação, mas antes para me transferirem os seus pecados.
Chamo-me António Ribeiro, sou eclesiástico, faz oito anos, e hoje, como em todos os dias, é dia do Sacramento da Confissão e a meu cargo tenho quatro paróquias.
E este é o meu actual estado de alma!
 
P.S. Música de Gorillaz - Latin Simone (Que Pasa Contigo?)