domingo, 24 de abril de 2011

Y2K – o Illinoise do milénio

       Surpreendentemente, houve poucas falhas decorrentes do Bug do milénio, que se revelou quase que inofensivo apesar de ter gerado uma onda de pânico colectivo, especialmente nos países nos quais os computadores estavam mais vulgarizados. O assunto gerou muita polémica devido aos grandes lucros gerados pelas empresas de informática, foi alvo de matérias copiosas na imprensa e deu até origem a vários filmes de gosto duvidoso. Hoje é considerado como um dos casos registados pela História de pânico colectivo vazio de fundamentos, uma versão moderna do "temor do fim do mundo" que também acometeu os povos Medievais no virar do ano de 999 para 1000. Foi despojado Y2K que assolou o mundo, excepto em Portugal; na verdade este país de brandos costumes viu-se acossado ao virar do século por uma vaga inesperada de abusos sexuais, e ainda com efeitos mais maléficos, como uma praga se tratasse, vi a maior parte dos meus amigos a cristalizarem-se nas suas anteriores vanguardistas opções musicais.
Em pânico fiquei, sozinho, porque sem outros que tais anteriores escaravelhos, na busca do Santo Graal da música, da escrita, da arte; que é como diz, da busca do contacto terreal com um qualquer Deus dos céus.
De facto existem obras em que nos apercebemos facilmente que existiu nelas a intervenção de um Criador, purificador e aglutinador que mostra aos humanos o melhor que podem fazer sem ser em justaposição com o pior que se pode fazer. Não tenham quaisquer ilusões, Deus expõe-se com todo o seu esplendor na arte, na 1.ª à 7.ª, pelo que para mim, a arte, quer se debruce sobre aspectos religiosos ou não, é sempre sacra, pois coloca-me em contacto com a magnificência do Supremo. Mas como referi, no virar do século ao confrontar os meus amigos com autores e temas novos que não faziam parte daquilo que para eles era adquirido, certamente por consequência do maléfico Y2K, obtinha na maioria dos casos respostas do género:
- “Nunca mais vai existir nada como Joy Division!”
 - “ Nem compares isso com Tindersticks!”
- “ Aí se os Clash ainda tocassem, esses gajos nem sequer lhes faziam as primeiras partes”.
Com estes ainda se podia dialogar, nos casos mais graves a respostas foram:
- “ O meu filho é mesmo inteligente, algumas vezes até fico preocupado!”
- “ A Gustava da contabilidade é mesmo gostosa.”
- “Olha pá, comprei uns pneus novos para o carro e um lugar cativo no Benfica, quando é que apareces?”.
Mas a minha Nossa Senhora da Nazaré não dormita em serviço, quando fui ao seu Santuário, chorar um bocadinho pelo o facto de não ter junto a mim um escaravelho pecador o suficiente para que, sem renegar os heróis musicais da infância, me ajudasse na busca do Graal, eis que, algures em 2005, após cinco anos de pouca esperança nos culturais anos vindouros, recebi uma chamada, que viria a mudar em muito o panorama do que sou, do que queria ser; e que fizeram ter confiança suficiente para que consiga, mesmo que em letras tortas, escrever hoje o que quero.
Conheci o Luís Moniz nesse ano, entrou num grémio de muitos bons amigos, um amigo que me fazia muita falta, porque sinto que já o era antes de o ser. Com ele, tento descobrir Deus na terra, através da arte dos demais, e até aquela que em mim possa existir. Quando o Luís, como que por artes mágicas, me colocou a rabiscar, com toda a sua paciência, e diga-se aturado esforço; primeiro, para me ajudar a despertar a voz que ainda esgaravato, pôs-me, previdentemente, a apreender as vogais, proferidas por Pessoa; e agora as consoantes, vagarosa mas consistentemente, proferidas por gente desta terra que tenta descobrir o seu de Deus nos seus próprios feitos, entre muitos, falo de vós, Octávio e Bruno (todos eles fundadores do www.esquinas.org ), que muito me enaltece a honra de convosco partilhar o melhor que esta pátria Lusitana ainda pode fazer; e que de modo autónomo surgiram como o complemento da “grande prenda Açoriana” chamada Luís, mas que em mim conquistaram um pleno espaço autónomo, pelo que o meu grande bem-haja também a vós, a este meu grémio de verdadeiras amizades.
Grande ano aquele de 2005, estrumado o suficiente para que a safra tenha sido um Vintage da melhor qualidade. Para afamar a ocorrência, Deus com toda a sua sapiência, incumbiu Sufjean Stevens das celebrações.
A responsabilidade era grande, mas Sufjan Stevens não se deteve, criou aquele que para mim é o melhor trabalho realizado depois do virar do século, e convidou-nos para “Come in feel the Illinoise.”, o seu quarto trabalho de originais. E que convite este meus amigos! Illinoise é por direito próprio um disco consistente o suficiente para rivalizar com o melhor que a Independente (agora indie) e a Pop fizeram desde sempre. São vinte e dois deliciosos temas, que transforma o cd num verdadeiro realejo, pois podemos colocá-lo em repeat, sem que isso se transforme num aborrecimento, pois está sempre a debitar coisas boas, tonalmente equilibradas o suficiente para que não denotemos que entre a música Europeia e a Americana existe um oceano de história que as separa. O verdadeiro artista é aquele que é arrojado na simplicidade da sua obra. E esta é daquelas que se gosta do princípio ao fim, até porque antes de existir já o era. Ou seja, porque todos já tínhamos o Illinoise dentro de nós, bastava apenas que alguém o materializasse, num projecto sem par no actual cenário musical. Ao contrário do que muito se diz por aí, o actual panorama musical é dos mais ricos que já alguma vez existiu. O facto do preço dos equipamentos de estúdio se terem banalizados, permitem o surgimento de autores que enriquecem em muito a cultura popular actual; de outro modo, seriam quanto muito, célebres na estação de metropolitano mais da casa de seus pais. Uma nota mais, este Cd tem uma outra característica tem uma capa verdadeiramente original e genial, coisa rara nos dias que correm (que saudades do LP). Apenas um aspecto negativo no excelente Illinoise, o autor deveria ter nos créditos referido que um dos temas, não vou dizer qual descubram por vós, utiliza um sampler de um tema dos The Cure, é tão manifesto, que soa a homenagem aos mesmos, mas ainda assim, penso, que em nome da verdade, deveria ter efectuado a referida referência. Só lhe ficava bem!


Illinoise – Disco obrigatório numa discografia de bom gosto, que está novamente à venda na Fnac e desta feita com um preço bem mais económico, serão os € 9,90 euros mais bem empregues da vossa, rápido, antes que esgote, vida!

Classificação: 5 estrelas - Discografia Ideal

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